Seg, 17/Mai/2010 00:00 Agroecologia
Limoeiro do Norte. Foram 42 as mortes causadas por câncer nesse município, a maioria entre agricultores, somente no ano passado. O número é considerado alto demais para um município com pouco mais de 50 mil habitantes. O registro não difere muito dos outros anos na mesma cidade.
Porque ainda não se pode dizer "com toda clareza", especialistas evitam ser categóricos sobre relação de efeito e causa entre o uso indiscriminado de agrotóxicos na Chapada do Apodi e os óbitos por neoplasia (câncer).
Mesmo assim, mais de dois anos de levantamento científico da Universidade Federal do Ceará (UFC) na região leva a médica e professora Raquel Rigotto, que lidera o grupo de pesquisa, a dizer que "a relação entre câncer e agrotóxicos está muito estabelecida, com diversos ativos e contaminantes, e não só câncer", explica a pesquisadora, que participa hoje de audiência pública em Limoeiro do Norte sobre o impacto da pulverização aérea dos aditivos químicos nas lavouras cultivadas na Chapada do Apodi.
Os estudos servirão de instrução ao Ministério Público em ação judicial, que poderá resultar na possível suspensão do manejo de pulverização aérea dos venenos no cultivo de culturas, principalmente de frutas como abacaxi, melão e banana.
Veneno e câncer são palavras já incluídas em todas as discussões sobre o impacto, na saúde humana, dos agrotóxicos aplicados na Chapada do Apodi, veiculadas nas matérias do Diário do Nordeste.
Porém, a ênfase de que uma coisa "não pode se dissociar da outra", no caso de Limoeiro do Norte, ficou evidente no Seminário "A violação de Direitos Fundamentais Frente aos Impactos Sócio-Ambientais do Agronegócio na Chapada do Apodi", realizado no Departamento de Mestrado da Faculdade de Direito da UFC, na última segunda-feira.
Dentre os participantes, além da pesquisadora Raquel Rigotto, o professor Gerson Marques, chefe da Procuradoria Regional do Trabalho da 7ª Região. Ele informou que o Ministério Público do Trabalho está celebrando convênio com a UFC para que as provas levantadas na pesquisa sirvam para instruir o Ministério Público na ação judicial "quando for necessário", segundo pontuou.
Os agrotóxicos são utilizados na Chapada do Apodi de forma indiscriminada e desconhecida. Pelo menos 68% das pessoas que aplicam o produto para combater as pragas não sabem que tipo de veneno estão usando.
Não bastasse isso, alguns dos produtos utilizados, considerados "extremamente tóxicos" e "muito perigosos" ao meio ambiente, estão na relação de venenos em "reavaliação" pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Apesar de permitidos no Brasil, esses pesticidas não o são na maioria dos países do mundo. O "Gramoxone", um herbicida, é um deles.
Desde 2007 o Núcleo Trabalho, Meio Ambiente e Saúde para a Sustentabilidade (Tramas), da UFC, realiza levantamentos sobre saúde humana e do meio ambiente na Chapada do Apodi, bem como interpreta os levantamentos feitos por instituições públicas.
Mas de dez poços subterrâneos analisados, pelo menos em cinco foram encontrados venenos. Falam por si só os números levantados pelo relatório da Companhia de Gestão de Recurso Hídricos (Cogerh), sobre a qualidade da água do aquífero Jandaíra, a segunda maior reserva subterrânea da Região Nordeste, situada entre os estados do Ceará e do Rio Grande do Norte.
Localizações anatômicas
Os pesquisadores do Núcleo Tramas reuniram os dados de câncer nos últimos dez anos e fizeram o levantamento de 23 localizações anatômicas de câncer. Ao separar agricultores de não agricultores, a frequência de câncer do primeiro grupo tinha sido maior que a esperada em 15 das 23 localizações.
"No caso específico do Vale do Jaguaribe, os dados não mostram ainda com clareza, mas porque o câncer têm um período de latência relativo. A relação entre câncer e agrotóxicos está muito estabelecida, e não só câncer, como doenças endócrinas, diabetes, tipos de tireoide, doenças imunológicas, infertilidade, suicídio, má formação congênita, abortamento precoce, hepatopatia, doenças de pele e alérgicas", afirma a pesPesquisa relaciona casos de câncer com agrotóxicosquisadora Raquel Rigotto.
[Do Diário do Nordeste, reproduzido na página do MST]
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