terça-feira, 11 de maio de 2010

Lixo eletrônico vai para aterro


Ter, 04/Mai/2010 00:00 Lixo e Reciclagem
Por Andréa Castello Branco

O que tem valor comercial é retirado e a sucata tóxica vai para lixo comum

Lixão. Produtos eletroeletrônicos, que possuem metais preciosos e também elementos tóxicos como o chumbo, o cádmio e o mercúrio, são descartados no lixo comum e vão para os aterros.
Quantos aparelhos de celular você já teve? Pela sua sala, passaram quantas TVs? A torradeira, o ferro elétrico, aquele PC pré-jurássico, que fim levaram? Muitos equipamentos foram parar na casa do zelador, do vizinho, coisa comum num país como o Brasil. É fácil doar. Difícil é saber o destino final do lixo que produzimos e que carrega elementos tóxicos como o chumbo, o cádmio e o mercúrio.
Segundo previsões do Programa Ambiental das Nações Unidas (Unep), organismo ligado à ONU, o resíduo eletrônico irá aumentar 500% em dez anos nos países em desenvolvimento e o Brasil está entre os que mais consomem e menos reciclam. "Índia, Brasil, México poderão ter crescentes danos ambientais e problemas de saúde caso a reciclagem do lixo eletrônico seja deixada aos cuidados aleatórios do setor informal".
É exatamente isso que está acontecendo em Minas Gerais. Se o consumo consciente depende unicamente do desejo do cidadão, o descarte consciente - e não só para deixar a consciência limpa - ainda é um tema distante do interesse público. Como uma pessoa qualquer, tentei me desfazer de uma televisão velha, um ferro elétrico e dois celulares. Poderia deixar a televisão na porta da minha casa que certamente ela desaparecia em poucos minutos, mas queria ter certeza de que eles teriam um destino correto, principalmente a parte tóxica.
Na Secretaria Municipal do Meio Ambiente, fui informada de que não existe nenhuma gerência de lixo eletrônico. A recomendação foi ligar para a Superintendência de Limpeza Urbana (SLU). A SLU orientou que levasse tudo a uma das Unidades de Recebimento de Pequenos Volumes (URPV), lá seria o descarte correto.
Mas, chegando ao local, na barragem Santa Lúcia, vi que faria pouca diferença deixar ali ou na porta da minha casa. A zeladora do espaço conta que os colchões, móveis, podas de árvore e partes de computadores que abarrotam as quatro caçambas vão direto para o aterro sanitário. "A gente não faz separação porque não tem como fazer. Vai tudo para o mesmo lugar", diz.
Na Secretaria de Estado do Meio Ambiente, a indicação para o descarte do lixo eletrônico foi o Centro Mineiro de Referência em Resíduo (CMRR), órgão ligado à Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam). Mas o centro não aceita nenhum tipo de sucata eletrônica, seja da população, de empresas ou do próprio poder público. Seu papel é ser um centro de apoio à gestão ambiental dos municípios.
A Asmare, associação de catadores de papel, recebe um grande volume de doações de eletrônicos, mas a pouca experiência, como admite a coordenadora de projetos Flávia Gonzaga, impede um aproveitamento maior do material. "Muita coisa se perde por falta de qualificação. Os computadores são desmontados sem a noção correta do que pode ser aproveitado. Mandamos para o aterro porque não sabemos o que fazer com o material", diz. Ela conta que a entidade tem recebido volumes cada vez maiores de eletrônicos. "Os galpões não estão preparados para isso. Se continuar dessa forma, vamos chegar ao caos".
Respostas. Susane Meyer, gestora do projeto de resíduos eletrônicos do CMRR, é bastante sincera ao ser perguntada para onde vai o lixo eletrônico produzido pelos mineiros. "Boa pergunta. Não existe um gerenciamento desse lixo. Geralmente, os sucateiros tiram o que tem algum valor e a parte perigosa é descartada em qualquer lugar ou vai se juntar ao resíduo urbano nos aterros".
O diretor de planejamento da SLU, Lucas Gariglio, justifica a falta de estrutura dizendo que o resíduo eletrônico ainda não é um problema para Belo Horizonte. "Ainda vai se tornar um problema, mas ainda não é algo que possa nos preocupar. Não há uma incidência significativa", explica. Gariglio também não vê problema em resíduos tóxicos irem para o aterro. "Uma bateria tem uma quantidade de chumbo muito pequena. O aterro é projetado para que essa contaminação não atinja o solo", diz. 
Alerta: Jogar material no lixão é equívoco
Receber no aterro resíduo eletrônico é um equívoco, para o engenheiro químico e ex-professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Wilfrid Keller Schwabe. “Essa é uma visão restrita da gestão ambiental. O conceito mais avançado é que nada tem que ir para o aterro antes de ser tratado. Ou você incinera ou faz a coleta seletiva antes de mandar para o lixão. Qualquer aterro sanitário um dia vai esgotar. Concordo que não seja um problema dos mais urgentes, mas é preciso recuperar os metais que estão dentro do lixo eletrônico”, diz.
Mário Kolberg, engenheiro químico e diretor da Divisão de Controle da Poluição Industrial da Fundação Estadual de Proteção ao Meio Ambiente do Rio Grande do Sul, diz que o descarte rotineiro da parte perigosa dos eletrônicos é o lixo comum.
“Ali, em meio a abacaxis, laranjas e cebolas, eles se decompõem. O PH mais ácido do chorume vai acelerar o processo de lixigação (destruição) desses metais, que se misturam a esse ‘caldo’ e penetram no solo, contaminando o lençol subterrâneo”, explica.
Segundo ele, a justificativa de que a quantidade de elementos tóxicos é pequena não se sustenta. “O problema é que eles estão concentrados num único ponto, que é a área do aterro. Uma coisa é ter algumas pilhas, outra coisa é ter toneladas de pilhas, lâmpadas, placas de computador em um processo contínuo de contaminação. Os aterros operam 40, 60 anos. Se a maioria dos governos municipais tem dificuldade de tratar o esgoto, que dirá os seus aterros”, critica. (ACB)
Montanhas de lixo
69 mil toneladas de lixo eletrônico são produzidas por ano em Minas Gerais, segundo diagnóstico feito pela CMRR e pela Empa (Suíça)
50 milhões de toneladas de lixo eletrônico são gerados no mundo a cada ano, segundo o Greenpeace. Menos de 10% desse volume é reciclado, segundo a ONU.

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