quarta-feira, 12 de maio de 2010

O que está ocorrendo no Golfo do México pode ocorrer no Brasil?



Sex, 07/Mai/2010 00:00 Geral
Escrito por Maurício Green e Carlos Boeckh *

Acidente ambiental nos Estados Unidos
O que está ocorrendo no Golfo do México pode ocorrer no Brasil?
Estamos preparados?
BP Spill of 2010. Photo: HuffingtonPost.com
O acidente ocorrido com a plataforma de perfuração Deepwater Horizon que está alarmando todos os EUA e a comunidade mundial ocorreu devido à perda do controle do poço que causou o fenômeno conhecido como “blowout” ou erupção do poço. Estes eventos são de baixa frequência, porém de elevado potencial poluidor. Este tipo de acidente ocorre quando há uma falha no BOP (blowout preventer), uma grande válvula
localizada na cabeça de poços de perfuração, que deve ser fechada caso o controle dos fluidos do reservatório seja perdido pela tripulação da plataforma.
No caso da Deepwater Horizon, os desafios de retomar o controle do poço e parar o vazamento são muito grandes, devido à lâmina d’água de trabalho (1500 metros) e da profundidade do poço (5400 metros). Já foram feitas tentativas sem sucesso de reativar o BOP utilizando-se ROVs (veículos subaquáticos de operação remota). Atualmente está sendo construída uma câmara para conter o óleo ainda no fundo, e bombeá-lo para a superfície. Contudo, esta técnica nunca foi usada nesta profundidade e sua aplicação está prevista para ser iniciada em uma semana. Em outra frente, um novo poço está sendo perfurado no mesmo reservatório para aliviar a pressão e tamponar o vazamento por dentro do reservatório. Esta seria a solução definitiva, contudo esse procedimento deve demorar por volta de 3 meses para ser concluído, ficando claro então que o óleo continuará vazando por um bom tempo.
Como resposta ao vazamento na superfície, milhares de litros de dispersantes, produtos químicos surfactantes que fazem o óleo afundar, já foram lançados sobre a mancha. Mais de 70 embarcações estão sendo usadas para conter e recolher o óleo com auxílio de equipamentos específicos para este tipo de acidente. Milhares de metros de barreiras de contenção foram posicionadas na linha da costa para impedir que o óleo chegue ao litoral. A última tentativa de minimizar os impactos foi lançar dispersantes no fundo do mar, junto aos pontos de vazamento. Porém, todo este esforço apenas reduzirá os gigantescos impactos ambientais e consequentes impactos econômicos e sociais na região do Golfo do México, impactos estes que podem se espalhar ainda mais.
A BP (British Petroleum), dona do poço e responsável por todos os custos das operações de contenção e limpeza, estima estar gastando 6 milhões de dólares ao dia. Estimando assim, ao fim do processo de limpeza um gasto de 8 bilhões de dólares. Isto sem contar com pesadas multas e indenizações futuras.
Este desastre tem levantado muitas questões que precisam ser respondidas não só nos EUA, mas também aqui no Brasil, uma vez que é notória a expansão da indústria do petróleo em águas brasileiras. Os americanos estavam preparados? Estamos preparados?
Os Estados Unidos são uma nação que tem uma grande cultura de segurança e resposta a emergências e estão provando ter muitos recursos para lidar com um incidente como este. Mesmo assim, neste caso, grandes impactos serão inevitáveis devido à magnitude do acidente.
No Brasil, a Lei Federal nº 9966 de 2000, que dispõe sobre a prevenção, o controle e a fiscalização da poluição causada por lançamento de óleo e outras substâncias nocivas ou perigosas em águas sob jurisdição nacional, foi uma resposta aos acidentes ocorridos à época. Esta lei e suas regulamentações (resolução CONAMA 293/2001, posteriormente substituída pela resolução CONAMA 398/2008), assim como as lições aprendidas à época fizeram com que o grau de preparação para um acidente com óleo aumentasse substancialmente no Brasil. 
Atualmente a Petrobras tem centros de defesa espalhados por todo o território nacional e está muito bem preparada para a resposta a incidentes com óleo, possuindo tanto equipamentos quanto pessoal especializado. Assim como a Petrobras, as outras empresas do ramo se preparam para este tipo de evento contratando serviços terceirizados ou investindo em recursos próprios. Em agosto deste ano será realizado em Manaus um grande simulado internacional (MOBEX - International Mobilization, Preparedness & Response Exercise), capitaneado pela CCA (Clean Caribian & America) e tendo como membro realizador do evento a Petrobras, com o apoio do governo brasileiro.
Um incidente com as mesmas características deste que ocorre nos EUA é passível de ocorrer no Brasil, uma vez que o problema se deu devido a uma falha num equipamento que é usado em todas as perfurações marítimas em águas profundas. Contudo, ao contrário do que ocorre na região do Golfo do México, num acidente em águas profundas nas principais bacias brasileiras (Espírito Santo, Campos e Santos), o óleo derramado teria menor probabilidade de atingir a costa. Isto se deve às condições oceanográficas da costa brasileira, que tendem a manter a macha de óleo afastada da costa, como demonstrado nos estudos de modelagens matemáticas de deriva de óleo. Entretanto, não podemos nos basear nesta premissa para diminuir o grau de preparação de resposta.
Para que possamos estar mais bem preparados para responder a acidentes não só durante a exploração e produção offshore, como também no transporte de óleo e nas questões portuárias, algumas medidas devem ser tomadas. Dentre elas, é preciso que haja primeiramente um avanço no cumprimento da legislação. A lei nº 9966 e sua regulamentação, por exemplo, ainda não são plenamente cumpridas. Em todo o Brasil, muitas instalações portuárias ainda não possuem o Plano de Emergência Individual (PEI), nenhum Plano de Área foi consolidado até hoje e o Plano Nacional de Contingência (PNC) continua a ser discutido. 
O Plano de Emergência Individual (PEI) tem como função garantir procedimentos e recursos de resposta local. Se por um lado muitas instalações portuárias, estaleiros, clubes e marinas ainda não possuem o PEI, por outro lado todas as plataformas de exploração e produção os têm, uma vez que sem estes documentos não seria possível obter as licenças do IBAMA. Os planos de área, que teriam por função agrupar os PEI’s de uma região, criando uma estrutura regional de resposta,
também ainda não existem. O Plano Nacional de Contingência, que tem como função criar uma estrutura nacional de resposta, definindo responsabilidades e um comando unificado, segue sendo discutido impossibilitando que o Brasil participe dos planos internacionais de emergência.
Além disso, especial atenção deve ser dada às resoluções do CONAMA (Conselho Nacional de Meio Ambiente) 269/00, que regulamenta sobre o uso de dispersantes químicos em derrames de óleo no mar, e 398/08, que dispõe sobre o conteúdo mínimo do Plano de Emergência Individual para incidentes de poluição por óleo e orienta a sua elaboração. A resolução 269/00 precisa ser mais clara quanto aos critérios de utilização de dispersantes e da necessidade ou não de anuência do órgão ambiental. Já a resolução 398/00 apresentou avanços em relação a sua versão anterior, resolução CONAMA 293/2001, exigindo uma modelagem matemática de dispersão do óleo e deixando claro que todos os terminais portuários de onde se originam e destinam-se navios devem possuir um PEI. Contudo, foram feitas alterações na legislação que se mostraram pouco conservadoras, especialmente quanto ao dimensionamento do volume de pior caso para plataformas de petróleo, já que a resolução 293 exigia que este dimensionamento fosse feito levando-se em conta o descontrole do poço por 30 dias, enquanto a resolução atual, 398/08, exige que se leve em conta o descontrole do poço por apenas 4 dias. Como vemos no caso da Deepwater Horizon a resolução 293 era mais realista levando em conta o caso de um blowout. Essas questões precisam ser sanadas para que possamos responder com maior eficiência a um acidente com óleo, seja este de pequeno ou de grande porte.
Por fim, vale lembrar que devemos procurar aprender com as lições obtidas a partir de um acidente como o que está ocorrendo no Golfo do México, o primeiro deste tipo em águas profundas. Além disso, precisamos não só incorporar as tecnologias desenvolvidas para responder a esta emergência, como também desenvolver nossa própria tecnologia de combate para um evento semelhante.
* Maurício Green
Analista Ambiental / HidroClean Proteção Ambiental

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