segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Censo Agropecuário e Agricultura Familiar

O incômodo Censo Agropecuário

Roberto Malvezzi (Gogó)*



O último censo agropecuário trouxe verdades incômodas que atiçaram a ira do agronegócio brasileiro. Afinal, a pobre agricultura familiar, com apenas 24,3% (ou 80,25 milhões de hectares) da área agrícola, é responsável “por 87% da produção nacional de mandioca; 70% da produção de feijão; 46% da de milho; 38% da de café; 34% da de arroz; 58% da de leite; 59% do plantel de suínos; 50% da de aves; 30% da de bovinos; e, ainda, 21% da de trigo. A cultura com menor participação da agricultura familiar foi a soja (16%). O valor médio da produção anual da agricultura familiar foi de R$ 13,99 mil”, segundo o IBGE. Quando se fala em agricultura orgânica, o percentual chega a 80%. Além do mais, provou que tem peso econômico, uma vez que é responsável por 10% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional.
O problema é que a agricultura familiar, além de ter menos terras, tem menos recurso público como suporte de suas atividades. Recebeu cerca de R$ 13 bilhões em 2008 contra cerca de R$ 100 bilhões do agronegócio. Portanto, essa pobre, marginal e odiada agricultura tem peso econômico, social e uma sustentabilidade muito maior que os grandes empreendimentos. Retire os R$ 100 bilhões de suporte público do agronegócio e veremos qual é realmente sua sustentabilidade, até mesmo econômica. Retire as unidades familiares produtivas dos frangos e suínos e vamos ver o que sobra das grandes empresas que se alicerçam em sua produção.
Mas a agricultura familiar continua perdendo espaço. A concentração da terra aumentou e diminuiu o espaço dos pequenos. A tendência, como dizem os cientistas, parece apontar para o desaparecimento dessas atividades agrícolas.
Porém, saber produzir comida é uma arte. Exige presença contínua, proximidade com as culturas, cuidado de artesão. O grande negócio não tem o “saber fazer” dessa agricultura de pequenos. E, bom que se diga, não se constrói uma cultura de agricultura de um dia para o outro. A Venezuela, dominada secularmente por latifúndios, não é auto-suficiente em nenhum produto da cesta básica. Exporta petróleo para comprar comida. Chávez, ao chegar ao poder, insiste em criar um campesinato. Mas está difícil, já que a tradição é fundamental para haver uma geração de agricultores produtores de alimentos.
O Brasil ainda tem – cada vez menos – agricultores que tem a arte de plantar e produzir comida. O Norte e Nordeste mais permeados pela tradição negra e indígena. O Sul e Sudeste mais permeados pela tradição europeia (italianos, alemães, polacos etc). É preciso, ainda, considerar a presença japonesa na produção de hortifrutigranjeiros nos cinturões das grandes cidades.
Preservar esses agricultores é preservar o “saber fazer” de produtos alimentares. Se um dia eles desaparecerem, o povo brasileiro, na sua totalidade, sofrerá com essa ausência. Para que eles se mantenham no campo são necessárias políticas que os apoiem ostensivamente, até mesmo com subsídio, como faz a Europa. Do contrário, se dependermos do agronegócio, vamos comer soja, chupar cana e beber etanol.

* Integrante da direção da Comissão Pastoral da Terra nacional (CPT)

(Os artigos publicados não reproduzem, necessariamente, a opinião do Ibase.)

Publicado em 23/10/2009.

Um comentário:

  1. Há uma distorção no termo agricultura familiar.
    Um caminheiro amigo ao entregar adubo da Nitrofértil em Goiás perguntou: onde estão os empregados para descarregar?
    LOGO APÓS APARECERAM FILHOS E FILHAS DO FAZENDEIRO QUE COM SUAS PÁS ENCHEDEIRAS(TRATOR), RÁPIDAMENTE O DESCARREGARAM NÃO SEM NO FINAL VARRER TODO O ADUBO RESTANTE NA CARROCERIA.

    UMA FAZENDA DE MIL HECTARES TOCADA PELO AGRICULTOR E FAMÍLIA COM MÁQUINAS PLANTADEIRAS E COLHEITADEIRAS, PRÓPRIAS OU ARRENDADAS, É UMA PROPRIEDADE FAMILIAR? Vejo-a mais como uma empresa familiar assim comofamiliar é o grupo Votorantim.
    Nossa produção de grãos foi de 176 MI DE TON EM 2011 COM PRODUTIVIDADE DE 4000 KG/HECTARE.
    Assim, a propriedade familiar deveria ter produzido 320 milhões de ton de grãos com seus mais de 80 MI de Ha. Provávelmente eles estão se referindo ao MST que recebeu 80 MI de Ha no Gov Lula e são instruidos a declarar o que "produziram" ao IBGE.PEÇAM AS NOTAS FISCAIS DE SUA PRODUÇÃO!!!PEÇAM A DECLARAÇÃO NO IR!!! No entanto, ainda recebem, quase todos, cestas básicas do governo. Que fizeram com o dinheiro e com o que produziram, se produziram tanto?
    A Produção de suinos e aves é quase toda integrada ao pequeno produtor por motivos sanitários: evitar que uma doença em uma unidade contamine todo o plantel.
    NO ENTANTO, OS PORQUINHOS,OS PINTINHOS, AS RAÇOES E OS REMÉDIOS SÃO FORNECIDOS PELO GRANDE PRODUTOR COMO SADIA E PERDIGÃO QUE LHES PAGA POR UNIDADE PRODUZIDA, AO FINAL assim como lhes deixa o adubo orgânico, a cama de frango.
    Boa parte dos produtores empresariais de grãos o fazem em terras arrendadas a outrem, exatamente como fazem arrendando terras na Fazenda Itamarati no MS, hoje do MST.
    O custo imobilizado da terra é muito alto e se torna melhor o arrendamento.
    DECLARAR O QUE NÃO SE PRODUZIU É MUITO FÁCIL. QUERO MESMO É VER AS NF DE VENDAS.

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